sexta-feira, 21 de março de 2008

A NETA DO CAPITÃO CAJEIRA

Como filha muito mais nova, ia frequentemente com o meu pai a Ílhavo visitar o meu avô.
Subir ao sótão da casa , onde duas grandes arcas brasileiras cheias de coisas antigas me esperavam, fazia as minhas delícias. Era maravilhoso!
Como antes já disse, tinha então dez anos, frequentava a quarta classe e recordo-me de levar
vestido uma saia e bolero azul escuro com coelhinhos bordados que estreei numa festa da escola.
O meu pai e o meu avô, contavam-me histórias apaixonantes acerca do dia a dia no mar do
meu avô, primeiro nos mares da Terra Nova , mais tarde nos mares gelados da Gronelândia.
Eu perguntava a mim mesma, será verdade? Mas era mesmo verdade. Mais tarde,
fui encontrar no livro de Bernardo Santareno "Nos Mares Do Fim Do Mundo", uma dessas aventuras
que Ílhavo não devia trocar ,escrevendo o nome doutros /seus protegidos/.
O Capitão Cajeira foi o primeiro português a levar o seu barco e os seus corajosos marinheiros
aos mares gelados da Gronelândia...
Também nos arquivos dos Diários de bordo do Museu de Ílhavo podemos ler o mesmo.
Na próxima mensagem deste meu blogue vou tentar resumir um fantástico episódio que Bernardo Santareno relatou no seu livro. Este livro encontra-se à venda ou encomenda-se em qualquer Fnac do nosso País.

Defendo os meus familiares, sou assim, sempre fui assim...

sexta-feira, 7 de março de 2008

RECORDAÇÕES





Tinha então 10 anos..


Lembro-me de ir a Ílhavo com o meu pai visitar o meu avô, o capitão Cajeira, comandante do navio Santa Mafalda que pescou pela primeira vez para barcos portugueses, nos mares gelados da Gronelândia.

Assim dou início a este meu modesto blog.

quarta-feira, 5 de março de 2008


O meu avô, o Capitão Cajeira de Ílhavo na sua grande aventura nos Mares da Gronelândia, águas tenebrosas que foi o primeiro a navegar em barcos portugueses, tem num livro de 1962 de Ciclo Preparatório e Cursos Complementares de Virgílio Couto, um pequeno texto retirado do livro de Bernardo Santareno “Nos Mares do fim do Mundo”, livro esse que ainda se pode encontrar ou encomendar na Fnac.
O texto que passo a descrever, “ A Revolta”, mostra-nos o seu espírito destemido e o desejo de vencer. Valorosos e destemidos também acabam por se mostrar todos os pescadores, novos e velhos que com ele viveram essa aventura, uma vez que como se sabe, nessa data os navios de pesca não possuíam radar.

A REVOLTA

- “O ti´Rufino, de cabeça baixa, a olhar para o chão, a voz mais trémula, mas nítida ainda, conseguiu articular:
-“ Nada, sô capitão; na veja nisto calquer ofensa contra vocemecê, mas a gente na pode ir: os homens arreceiam esses mares estranhos. Cada qual tem a sua família: havemos de deixar-nos matar?!”
-“ E quem lhes disse que o mar da Groenlândia é pior que este, aqui da Terra Nova? Tenham vergonha nessas caras, não sejam maricas!... – volvia o capitão.
-“ Na vamos!” – ousou o Zé Cravo.
-“ Vão! Quero eu! Mando eu!
E o Cajeira, espumando de raiva, dava pontapés num molho de cordas para ali arrumado, Metia medo o homem! Com os grandes olhos congestionados e sangrentos a saírem das órbitas, fuzilava os pescadores, em relâmpagos duma violência selvagem:
-“ Oiçam… oiçam de uma vez para sempre, seus poltrões: Eu prometi ao armador que havia de ir com este navio à Groenlândia, que só voltaria a Portugal com o porão cheio de bacalhau… Prometi-lhe eu, empenhei nisso a minha palavra! Estão a ouvir bem? Nunca, nunca até ao dia de hoje, o capitão Cajeira faltou à sua palavra! Nunca!!!
-“ A água gela…” choramingou o Toino da Zefa.
-“ Morríamos de frio…” – insistiu o Manuel do Rosário.
-“ Na queremos ir!” – gritou mais uma vez, de novo bravio, o Zé Cravo.
Por momentos, o capitão olhou o moço em silêncio, cruelmente. Depois, num impulso incontível, foi-se a ele, arrastou-o como um boneco até ao mastro do centro e, com uma grossa corda, a este o amarrou, decidido, sem uma quebra na fúria.
-“ Eh, mulherengos!... Eh, homenzecos de pataco! ouvi bem: o que agora sucede ao Zé Cravo, sucederá a outro qualquer que tente desobedecer-me… A outro qualquer, velho ou novo, verde ou maduro!”

E foi assim que o “Rio Lima” pescou, pela primeira vez para barcos portugueses, nas águas tenebrosas da Gronelândia.