domingo, 22 de março de 2009

Fui assim...


Indo eu um dia a atravessar o Largo do Rato com uma amiga, guiando o automóvel do meu pai, parámos junto do polícia sinaleiro ( muito importante em cima da sua pianha de madeira alta, grande e redonda) que soprava sem parar com o seu apito de metal reluzente e de som vibrante, a orientar o complicado trânsito local. Tendo ainda pouca experiência de conduzir, pois tinha tirado a carta há muito pouco tempo, ao ouvir subitamente o seu apito mandando-me seguir e contornar o seu palanque para voltar à esquerda, arranquei a toda a velocidade com medo de me atrasar e, talvez um pouco nervosa, não sei como, ao dar a volta bati violentamente no seu frágil apoio. Parei imediatamente a alguns metros. O homem cambaleou atónito, barafustou, gesticulou, apitou tanto e de tal maneira que eu atrapalhada e arrependida, tendo sempre presente as boas maneiras e delicadeza aprendidas no Colégio do Sagrado Coração de Maria, resolvi recuar e pedir-lhe desculpa, mas com tão pouco jeito e atrapalhação que lhe voltei a dar novamente outra forte pancada! Não consigo descrever a reacção do pobre polícia que já só queria ver-me dali para fora... Desta vez já não apitou. Com o capacete branco um pouco descaído para o lado, o olhar turvo e o apito numa das mãos, dobrou-se todo para a frente pondo em risco o seu equilíbrio e com os dois braços a ondular expressivamente apontando o longe, suplicava:
- Vá-se embora! Vá-se embora!
Achei então melhor partir bem depressa sem me desculpar, não fosse a paciência do bom homem esgotar-se ou com novo pedido de desculpas, mandá-lo eu talvez, para o hospital!...

terça-feira, 17 de março de 2009

A pesca do bacalhau nos mares da Gronelândia





























Revista Oceanos
Terra Nova

A Epopeia do Bacalhau
Nº 45, Janeiro/Março, 2001

…Foram fracas as campanhas dos últimos anos da década de 20. Em 1930 os navios regressam, mais uma campanha fraca.
Mas Ílhavo anima-se à chegada dos seus homens que andam bamboleando nas ruas como se ainda um
convés pisassem .
Passam os carros de bois carregados com os sacos de lona da roupa de bordo, cheirando a salgado e ao azougue das cavernas. Vai a roupa ao rol para a lavadeira a levar ao rio. Faz-se a procissão do Senhor dos Navegantes, andor aos ombros de marinheiros que cumprem promessas.
Juntam-se os «bacalhoeiros» na praça, na farmácia,
no barbeiro e este, de tanto os ouvir, já conhece os espalques ( locais de bom fundo) do Grande Banco, de cor e salteado os baixos de Rocks, os rumos, quantas as remadas.
Contam-se histórias, recordam-se os maus tempos, lamentam-se os naufrágios e as vidas perdidas. Mas vieram intrigados por terem deixado de avistar, por uns tempos, o «Santa Mafalda» no Virgin Rocks e no Grande Banco.
«- Por onde andou, Capitão Cajeira?
E este conta aos amigos e ao jornal «Beira Mar»:
- No ano passado chegaram até mim informações sobre a belíssima pesca que havia feito um navio francês nos Bancos da Groenlândia (…) Este ano cheguei aos Bancos da Terra Nova, procurei meus lugares preferidos de pesca aqueles onde em anos transactos, tenho feito boa safra. Uma grande desilusão sofri. Má pesca, escassez de peixe, uma arrelia…Resolvi, definitivamente, ir até aos Bancos da Groênlandia.
Partimos no dia 20 de Junho e tivemos uma viagem magnífica (…) Sem novidade e ao fim de 10 dias estávamos a 63º 40´ de latitude norte. Estávamos, então, sob a acção de um frio inclemente, cortante, indescritível (…) De todos os lados, mais perto e mais longe, se erguiam majestosos e bizarros os icebergs (…) De todos os tamanhos e de todos os feitios. Alguns davam-nos a impressão de veleiros singrando os mares, com o velame içado.
(…) Interessante mas tétrico. Interessantíssimas as auroras boreais.
- E pescaram?
- Oiça: castigada pelo frio intensíssimo e ante o perigo eminente em que nos achávamos em virtude da proximidade dos icebergs, a tripulação reunida
declarou-me que era impossível pescar (…) Que não podiam, diziam eles, e eu tive de concordar. O fogão já não tinha calor suficiente para coser pão e a água já fervia com muita dificuldade. (…) Em derredor do navio, a certa distância, avistaram-se centenas de icebergs. Faziam um barulho ensurdecedor (…).
- Como escaparam de tão grande perigo?
- Tivemos a nosso favor um grande factor de ordem natural. Quase não havia noite naquelas longínquas
paragens. O sol rompia às duas horas da madrugada e só às 11e15 horas (da noite) desaparecia no horizonte.
- Três horas pouco mais de noite.
- É certo… e nem sequer nesse tempo dormia descansado. Com grande dificuldade e, por vezes em risco de nos perdermos, conseguimos descobrir uma aberta pela qual iniciámos o regresso.
Navegando com ventos contrários só conseguimos chegar aos bancos da Terra Nova em Julho».
(continua)

Diário Náutico do lugre “Santa Mafalda”, 1931, do capitão João Pereira Cajeira (1879-1958)

Pesca do Bacalhau -2ª parte


Não desistiu o capitão Cajeira. Os navios da Empresa de Pesca de Aveiro, por instruções determinantes do seu gerente Egas da Silva Salgueiro – o Senhor Egas - no ano seguinte irão à Groenlândia, ou são bem sucedidos ou amarram. E em 1931 o «Santa Mafalda» do capitão João Pereira Cajeira, o seu gémeo «Santa Isabel» do capitão Manuel dos Santos Labrincha e o «Santa Joana» do João da Cruz largam do Virgin Rocks para a Groenlândia, sem saberem uns dos outros. Ninguém mais se aventurou – nem armadores nem capitães. Andejo, o “Santa Mafalda” leva a reboque o ronceiro “Santa Luzia” do seu amigo capitão Aquiles Bilelo, da empresa de pesca de Viana, enquanto o mau tempo não os separa.
E o “Santa Joana” inicia a viagem no dia 2 de Julho.
Também a saída do «Santa Isabel» do Rocks não passou despercebida. Pois o piloto do «Argus» registou no dia 23 de Julho de 1931: «à tarde o “Santa Isabel” suspendeu seguindo rumo ao N (norte). Calculamos seguir para Greenland.

(Até que…) aos 7 dias do mês de Setembro com um carregamento de peixe salgado e dando por acabada a campanha de pesca, mandou o capitão seguirmos viagem para Portugal com destino a Aveiro».

Avistam-se ancorados, não saíram do Fyllas, o «Santa Mafalda» e o «Santa Luzia»; iça-se a bandeira nacional a tope no mastro da mezena para lhes dar a notícia do regresso. «algumas ilhas de gelo à vista muito frio ».
A 3 dias de viagem, céu muito carregado, muito escuro para o SW» - sinal de vento muito fresco. Ele aí está, zarro, zarro, de força 8 a 9; navio de capa só com a polaca, vela de estai e a vela grande nos segundos rizes.
E no dia 8 de Outubro, ao fim de 31 dias de viagem, ancora o «Santa Joana» em frente à barra de Aveiro, junto do “Santa Mafalda» que fez 27 dias de viagem e também apanhou temporal desfeito - «mar escangalhado de diversos quadrantes – tempo muito tempestuoso, já não sei qual o barco que possa resistir. O navio vai quase sempre submerso».
Divisa-se no horizonte da nossa barra… É um alvoroço em Ílhavo, nas Gafanhas…navio à vista, navio à barra…
- Olha, são os navios da Empresa, são os navios do Egas, conhecem-se tão bem, os calceses brancos, aqueles mastaréus tão altos, o tosado tão acentuado…- são, são e vêm bem pesados, olha trazem o convés na água, vêm carregadinhos – ai, mas quase não trazem dóris, se calhar foram varridos ao mar… - ih cum raio, aquele do norte só se lhe vêm os cabeços à proa, traz a borda toda partida…» .
Mas a barra não tem água suficiente para lhes dar entrada e no dia 10 de Outubro «pelas 10 horas veio o rebocador «Vouga» com o patrão que nos deu ordem para seguir para o Porto».
E com aguaceiros e vento fresco do quadrante de SW «com o pano todo largo puxando para o Porto».
De 43 navios na campanha de 1930, nesta de 1931 só participam 21.
Crise acentuada. Desemprego na classe: muitos pescadores em terra, lá lhes vai valendo a pesca da sardinha, sazonal, as artes do cerco, a pesca da ria. Pilotos chegam a embarcar de marinheiros em navios de comércio, assim tiram as derrotas a vapor; alguns emigram para o Brasil, conseguem a categoria de pilotos brasileiros. Ficam muitos em casa, dois, três anos, sem subsídios a viver das suas economias.
Foi a esperança no futuro, a viagem daqueles quatro lugres à Groenlândia, navegando só à vela, sem planos dos Bancos, desafiando mares desconhecidos – campos de gelo, meteorologia imprevisível: foram na verdade homens de rija têmpera, destemidos aqueles capitães e suas tripulações.

Para consulta de mais imagens pode CLICAR AQUI

(extractos da Revista Oceanos)

segunda-feira, 9 de março de 2009

Nasce-se para viver...


Nascer e depois viver

Nasce-se para viver!
Respira-se para amar!.
Foge-se da inquietação para se poder continuar!
Comovente…
Comovemo-nos com o parto de uma mulher,
Com uma tarde de encanto,
Com um sol diferente do dia anterior…
Enternecedor…
Enternecemo-nos com a magia das cores…
Com a alegria de um bom pronúncio
Com o olhar de um recém nascido
Acabado de vir ao mundo!

Enquanto que a vida… desperta-nos para tudo.
E nós só queremos olhar para a felicidade!
Mas a melancolia…
A angústia…e a tristeza
Têm sempre um cantinho dentro da pessoa…
Ou então não éramos humanos!

Na vida é difícil contrabalançar o bem e o mal!
Mas temos que prosseguir!
Mesmo com o mal correndo nas nossas têmporas, já esgotadas!
Mas temos que avançar...
E é por isso que lutamos, arduamente,
Fielmente,
Corajosamente,
pela subida da caminhada, da serenidade,
Também limitada,
Pelo meta da existência!


Ana Côrte-Real



Ana e os poemas que vêm da alma...


O que é senão a vida!

Ana… e os poemas que vêm da alma!
Pois se viessem do coração havia lágrimas de comoção
A todas as pessoas;
À breve brisa que corre hoje;
À leveza da passagem do momento;
À subtileza do amor;
À frieza do ódio;
Às quedas que damos durante a caminhada, para uns quase eterna,
para outros tão breve!
Aos anos que passam inalterados sendo nós que envelhecemos!
Mas só na carne, não no espírito…!
Lutemos para vencer o invencível!

Ao pormenor de cada minuto…
Jamais igual
Para sempre diferente…

Amemos o poder da particularidade!

Ao pormenor de cada pessoa…
Quando se pode gerar, dois seres iguais;
Quando se pode gerar, dois seres diferentes;
Ou quando se pode gerar unicamente, um ser!

Ana… e os poemas que vêm da alma!
Pois se viessem do coração havia lágrimas de comoção!

O Tempo não pára…
Quem pára somos nós, na nossa devida hora!
E os meus poemas continuam a brotar da alma,
pois o coração, só a mim pertence!
E os meus poemas continuam a brotar da alma,
porque só entrego o meu coração, a quem eu desejo!

Poema de Ana Côrte-Real

Poema de Ana Côrte-Real




A arte nas estrelas...

Copiar a cor de uma estrela que ilumina o céu durante a noite
Requer graça
Requer talento
Requer arte.
É a visão mais bonita do Universo!

A forma dita a sua beleza!
O brilho a sua vaidade!

No tempo, o artista… copiando a cor das estrelas…
E as estrelas sempre a cintilar na noite negra azul do céu!

quinta-feira, 5 de março de 2009

Porque gosto tanto dos cães...


Cão Dog Cane Perro Chien Koira Pies Rutshi


Neste mundo egoísta em que vivemos, o cão é o único amigo desinteressado que o homem pode ter. É o único que nunca o abandona, o único que nunca é ingrato ou traiçoeiro.
Os cães entendem os nossos pensamentos e se pensarmos coisas desagradáveis a seu respeito, eles percebem e ficam muito tristes.
Quando um cão abana a cauda, ficamos a saber que ele nos amará para sempre.
Não precisamos de lhe conquistar a confiança e amizade: ele nasceu para ser nosso amigo. Ele é como uma criança que está sempre disponível para amar e ser amada. Não importa ter pouco dinheiro ou quais são as nossas posses, ter um cão torna-nos ricos.
Se o seu cão acha que você é a melhor pessoa do mundo, não procure outra opinião. Os olhos de um cão são o espelho fiel da sua alma. É bom saber que há um olhar à nossa espera e que ganha mais brilho quando chegamos a casa.
O único defeito dos cães é terem vidas demasiado curtas…
Não interessa a língua em que pronunciamos o seu nome: cão, dog, cane, perro, chien koira, pies, rutshi, nestas ou em tantas outras, o cão é o animal do qual podemos fazer o nosso melhor amigo, em qualquer parte do mundo.

quarta-feira, 4 de março de 2009

Janelas


Poema de António Gedeão


Tenho 40 janelas nas paredes do meu quarto,
sem vidros nem bambinelas
posso ver através delas o mundo em que me reparto.
Por uma entra a luz do sol, por outra a luz do luar,
por outra a luz das estrelas que andam no céu a rolar.
Por esta entra a Via Láctea como um vapor de algodão,
por aquela a luz dos homens, pela outra a escuridão.
Pela maior entra o espanto, pela menor a certeza,
pela da frente a beleza que inunda de canto a canto.
Pela quadrada entra a esperança
de quatro lados iguais,
quatro arestas quatro vértices,
quatro pontos cardiais.
Pela redonda entra o sonho, que as vigias são redondas
Por além entra a tristeza,
por aquela entra a saudade, e o desejo dos homens e o tédio,
e o medo, e as melancolias,
e essa fome sem remédio a que se chama poesia.
E a inocência, e a bondade, e a dor própria,
e a dor alheia e a paixão que se incendeia,
e o grande pássaro branco,
e o grande pássaro negro, que se olham obliquamente,
arrepiados de medo.
Todos os risos e choros,
todas as fomes e sedes, tudo alonga a sua sombra
nas minhas quatro paredes.
Oh janelas do meu quarto, quem vos pudesse rasgar!
Com tanta janela aberta, falta-me luz e o luar!